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sábado, 12 de junho de 2010

QUEM QUISER QUE CONTE OUTRA


Num reino muito distante vivia Branca de Neve, que, já beirando os 50, entraria com uma denúncia no Procon ao constatar que não seria feliz para sempre coisíssima nenhuma, conforme prometera o estúdio de animação. Frustrada com o casamento, enganaria rotineiramente o príncipe sem maiores dramas de consciência, cada dia da semana com um anãozinho – mas sempre com camisinha. No caso, camisinhazinha.

O príncipe, ao cavalgar pelos arredores do reino enquanto era corneado, avistou um dia a casa de Prático, o mais esperto dos três porquinhos. Papo vai, papo vem e o futuro monarca convenceu o suíno a firmar sociedade com ele num frigorífico para produção de bacon sem colesterol e 0% de calorias. Mas Prático não foi esperto o suficiente para desconfiar que ele entraria com o bacon. Pensava que sua participação se restringiria à gestão estratégica do empreendimento, por conhecer a fundo o produto desde leitãozinho.

Emitido o atestado de óbito – e de burrice, o príncipe contrata o marceneiro Geppeto para fazer o caixão de Prático, cujo velório se realizaria após a missa de porco presente. Foi quando Pinóquio resolveu meter o nariz na história: “Meu faro diz que esse negócio de bacon light é muito promissor”, comentou ele com o napolitano vovozinho.

“Sou o sócio que todo empreendedor pediu ao Sebrae”, argumentou Pinóquio ao visitar o príncipe em sua fabriqueta de toucinho. “Se mentir ou tentar enganá-lo, meu nariz me denunciará”. Mais que convincente, o argumento era irresistível. Tinha à sua frente o sócio ideal: um sujeito compulsoriamente honesto!

Mas se associar empresarialmente ao príncipe não significava garantia de recursos fartos. A arrecadação de impostos no reino se resumia a umas poucas patacas, graças à inoperância da máquina administrativa. O jeito era arrumar um terceiro sócio – o capitalista. De imediato Pinóquio lembrou-se de Dona Baratinha, a que tem fita no cabelo mas jamais deixaria o dinheiro na caixinha: todos sabiam que aplicara tudo, incluindo o espólio de João Ratão, num fundo de investimento agressivo para ter lucro rápido e desbaratinar, pegando onda em Saquarema. (A título de curiosidade, João Ratão empanturrou-se até a morte com o bacon de Prático, um dos muitos pertences da substancial feijoada da Senhora Baratinha).

Ao ser consultado para aceitar a proposta, o famoso inseto da família dos blatídeos esquivou-se, alegando os planos de desbaratinamento acima citados e que já estava de malas prontas para a paradisíaca cidade fluminense. Mas indicou o Gato de Botas como parceiro no projeto, embora o felino tivesse sido um perseguidor implacável do seu amado João Ratão, nos porões de uma repartição pública.

Longe há muitos anos da burocracia estatal, o Gato de Botas andava agora de rabo preso ao jogo do bicho. Com as patas sobre a mesa do seu bunker e cofiando calmamente seus bigodes, recusou com polidez a oferta de Pinóquio e do príncipe: “O convite é tentador, mas não é zoológico abandonar nesse momento os meus negócios. Já falaram com o Shrek? Também ouvi dizer que a Cinderela, com aquela carinha de santa, tem cem mil contos de fada depositados na Suíça. Aposto que não sabiam disso, né. Um verdadeiro golpe de mestre...”

- Mestre... claro, o anão! Como não pensamos nele antes? Bem debaixo das minhas barbas! – retrucou o príncipe.

- E do meu nariz!, complementou Pinóquio. Com o trabalho nas minas, deve ter muito dinheiro guardado, o bastante para fazer do Diet Bacon um fenômeno nas gôndolas. Vamos já para o seu reino, príncipe.

Como a Lei de Murphy impera sempre, inclusive no mundo do faz-de-conta, aquele era o dia do Mestre dividir os lençóis com a insaciável Branca. Ou melhor, os maus lençóis: o príncipe e Pinóquio flagraram Branca de Neve no sofá, em sensuais preliminares com o Mestre, o Patinho Feio e a Bela Adormecida, que na ocasião parecia mais acordada que nunca.

Gritos, pancadas, tiros, golpes de espada, sangue derramado.

Até que chegou o soldadinho de chumbo, dando voz de prisão a todo mundo.

(continua qualquer dia desses)


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