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sábado, 25 de setembro de 2010

ATA DA ASSEMBLEIA ORDINÁRIA DO EDIFÍCIO ILHA DA GAIVOTA

Ilustração: Marco Fraga

Primeira pauta: Assuntos Gerais.

Após os procedimentos iniciais de praxe, e contando com a presença de 39 dos condôminos, o Sr. Rodolfo, do apartamento 41, disse que tinha uma queixa a fazer sobre o comportamento da Dona Maíra, do 42.
Segundo ele, ruídos denunciavam práticas diárias de foro íntimo por volta das 21h45, sendo o range-range de sua cama uma afronta aos bons costumes. Indignada, Dona Maíra esclareceu não tratar-se de suposta sem-vergonhice, mas dos exercícios abdominais e de flexão que é obrigada a fazer todas as noites, por indicação médica. E que mesmo que se tratasse da alegada prática, estaria em seu direito e não seria da conta de ninguém o que fizesse ou deixasse de fazer entre as quatro paredes do seu apartamento.

Nesse momento, Dr. Élcio, do 74, pediu a palavra dizendo que a falta de isolamento acústico se deve ao fato do prédio ter sido construído com tijolos baianos, motivo pelo qual era capaz de escutar até a reza da Dona Biloca, sua vizinha do 73. Complementou seu aparte afirmando que, quando quer manter intimidade com a esposa, tem de ligar o aparelho de som no último volume para abafar os naturais ruídos da conjunção carnal.

Isto posto, foi dada a vez à senhorita Elza, proprietária do apartamento 62, que sugeriu à assembleia a mudança do nome do edifício, já que o mesmo não é uma ilha e muito menos abriga gaivotas. Diante do exposto, o presidente da assembleia interrogou a moradora, dizendo se ela não tinha mais o que fazer, observação que provocou palmas em alguns dos presentes e gargalhadas em outros.

Em seguida, o subsíndico introduziu a segunda pauta da reunião: formação de fundo de reserva para a compra de apetrechos natalinos e figuras de presépio para o Natal.

Seu Luiz, do 51, 1º Secretário que acumula a função de tesoureiro, apresentou orçamento de três reis magos, mas recomendou a compra de apenas um, por medida de economia. Referiu-se ainda a um Baltazar em oferta num camelô da Rua Duque, e que a compra do mago de biscuit dava direito a um carneirinho de manjedoura grátis. Trêmula e demonstrando não estar de posse de seu juízo perfeito, Dona Geni do 36 foi taxativa ao afirmar que deixaria de pagar o condomínio caso não se adquirisse também uma ou duas vaquinhas malhadas, para fazer companhia ao carneiro junto ao bercinho do Menino-Deus.

Após acalorada discussão, a maioria dos presentes decidiu que o fundo de reserva arcaria com um presepinho básico e uma fiada de piscas de 200 lâmpadas para ornar a guarita, o qual seria ligado às 20 horas e desligado às 2 da manhã.

Prosseguindo, Dona Carla, moradora do 93, propôs a compra de um novo gira-gira para usufruto do pequeno Rafa, seu filho. Dona Albina, proprietária do 131, disse que “pequeno” era um eufemismo, dada a circunferência avantajada do menino e dos seus 82 quilos capazes de abalar a estrutura de qualquer gira-gira do planeta e arredores, segundo palavras da mesma. O Sr. Eduardo, do 22, argumentou que o gira-gira em questão já era o sexto a ter seu eixo entortado pelo robusto petiz. Ficou decidido solicitar ao Dr. Benício, engenheiro mecânico e morador do 114, um cálculo para determinar a estrutura necessária ao eixo, considerando-se as forças centrífuga e centrípeta versus o peso do garoto.

Procedeu-se então à eleição do novo síndico. De imediato o Sr. Waldemar lançou-se candidato à reeleição, argumentando que ao síndico assiste o direito de não pagar a taxa condominial e que, se não permanecesse no cargo, passaria à condição de inadimplente por não ter como honrar a referida taxa, o que seria pior para o condomínio. Assim, todos assentiram que o Sr. Waldemar prossiga em suas funções pelos próximos dois anos.

Tomada a deliberação, o Sr. Maurício do 173 cobrou do síndico a prestação de contas referente ao último exercício, ao que o Sr. Waldemar se esquivou, dizendo que precisaria de um apartamento inteiro e vago para guardar todas as notas e recibos da contabilidade predial. Não satisfeito com o argumento, o proprietário do 173 ameaçou o síndico com o dedo em riste, dizendo “ah, isso não vai ficar assim não”. Seguiram-se outros insultos até chegarem às vias de fato, aplicando-se mutuamente sopapos, bofetes, voadoras e outros golpes de natureza semelhante, o que obrigou à convocação de nova assembleia de condôminos, em data ainda a ser determinada.

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2 Comentários:

  • MARCELO!

    Achei interessante o rumo que a reunião tomou. Começou num range-range de uma cama que "incomodava e acabou não numa cama, mas uma mangedoura, cujo inquilino (o menino-Deus) também causou e ainda causa polêmica e assunto para várias ordens de condomínio, além da mudança de nome, conforme sugeriu a Sra Elza.

    O restante sugere quem sabe depois de tantos sopapos e voadores, um novo mundo, quem sabe um novo líder, quem sabe um domínio diferente.

    Um forte abraço!

    Mirze

    Por Blogger Unknown, às 25 de setembro de 2010 às 07:38  

  • Marcelo!

    Meu parco comentário, se deveu ao fato de estar em Belo Horizonte na casa da minha filha. Na viagem, perdi o laptop, e ainda fiquei presa pela WEBJET!

    Se quiser, agora que estou em casa refaço com maiores detalhes este riquíssimo texto.

    Beijos

    Mirze

    Por Blogger Unknown, às 28 de setembro de 2010 às 03:11  

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