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sábado, 18 de agosto de 2012

UNIVERSO PARALELO





Naqueles dias, o fake do Todo-Poderoso botou as manguinhas de fora e resolveu criar seu universo genérico, plano que acalentava há tempos. Pode-se argumentar que o termo "Universo", significando "todo, inteiro", não poderia comportar uma outra versão, qualquer que fosse ela, sob pena do vocábulo cair em descrédito. Mas não é a essa questão etimológica que vamos nos ater, pelo menos neste despretensioso relato.

Após um longo espreguiçamento, o godzinho de araque estalou os dedos, escovou os dentes, juntou todo o seu ímpeto empreendedor e partiu cheio de vontade para a intrincada missão. Começou concebendo o firmamento, que depois de ficar pronto demonstrou não ser firme o suficiente. Sim, amigos. O firmamento apresentava sérios e incontornáveis problemas de encaixe, não se fixava corretamente sobre o espaço infinito e jamais passaria pelo menos rigoroso dos controles de qualidade. Eram ainda visíveis rachaduras de natureza estrutural, evidenciando erros básicos de cálculo.

Nosso criador do mercado paralelo não se deixou abalar por esse primeiro contratempo e pôs-se a fazer as estrelas, tarefa que o manteve entretido por umas dezesseis longas horas, que teriam sido bem gastas se a empreitada chegasse a bom termo. Mas qual não foi sua surpresa ao constatar que todas elas nasceram cadentes (ou decadentes, como queiram), já que não paravam no já citado bambo firmamento.

É claro que o planeta Terra recebeu especial atenção do fake, que demonstrava o mesmo e incansável empenho em tudo o que executasse, desde o protótipo do abridor de latas até o ciclo das marés. Passou noites e mais noites em claro tentando dar forma ao cavalo de três orelhas e à rosa de pétalas não-despetaláveis (qualidade que, segundo ele, aumentaria em muito a vida útil das mesmas). Todavia, quanto mais tentava implementar aperfeiçoamentos às coisas do universo mais quebrava a cara em seu intento, revelando-se um verdadeiro trapalhão ao trocar as cores das verduras e legumes do tradicional verde para o vermelho, o azul e o rosa-choque, buscando com essa mudança despertar o interesse e a gula das crianças.

As anomalias de fabricação foram se perpetrando em série, como numa linha defeituosa de montagem. Feita também nas coxas, a água materializou-se na forma de H3O, trazendo com isso inconvenientes vários - dentre eles o mais básico e catastrófico, ou seja, o de não matar a sede em hipótese alguma.

Ao contrário do Todo-Poderoso de verdade, o deus postiço prometia a vida eterna mas não tinha a menor ideia de como entregar a mercadoria. O paraíso para os bons ficava só na promessa, uma espécie de título do governo com resgate em data imprecisa. Um precatório celeste, para ser mais exato – o que gerou uma série de processos junto aos órgãos de defesa do consumidor da época, movidos por centenas de milhares de crédulos lesados.


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Marcelo Pirajá Sguassábia é redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e eletrônicas.
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