REVOLUÇÃO DE ISOPOR
Antes de mais nada, agradeço a
presença de toda a diretoria do shopping a esta convocação extraordinária.
Bem, indo direto ao assunto: por
meio de pesquisas, detectamos que mais de 90% dos homens odeia aquilo que 100%
das mulheres adora: experimentar roupas. Para eles, é tortura chinesa entrar e
sair de loja, e dentro de cada loja entrar e sair do provador, e dentro de cada
provador entrar e sair de ternos, jaquetas, camisas, calças, sapatos... fora
isso tem aquela vendedora excessivamente prestativa, em geral comissionada, que
fica atrás da cortina perguntando a toda hora se ficou bom. Se não ficou, sem
problemas - ela já está a postos com outras nove peças na mão, prontinhas para
entrar e sair da máscula carcaça.
Diante dessa constatação surgiu a
ideia, que motivou essa nossa reunião. O negócio funcionaria da seguinte forma:
o sujeito vem até o shopping, tira a roupa em uma sala reservada e é escaneado
em 3 dimensões. A partir disso um software faz todos os cálculos e cria virtualmente
um clone do físico da pessoa. Os dados são transferidos para uma máquina
modeladora - que irá produzir um manequim em isopor do macho em questão. Todo o
processo não leva mais que dez minutos.
Finalizado o boneco, nossos
funcionários saem batendo perna pelo shopping procurando os itens solicitados
pelo cliente, de acordo com a predileção por marca, cor, numeração, estilo,
etc. Encontrando em alguma loja um produto que tenha a cara do nosso amigo, o
funcionário põe no boneco e vê se ficou bom. Se sim, nosso cliente é avisado
por celular que na loja tal, por tantos reais, tem uma calça x que cai com
perfeição no corpo dele. A foto do produto vai junto, e o sujeito só tem que
aprovar ou não a compra.
Logicamente que alguns itens ficam
fora do serviço. Roupas íntimas, por exemplo. Os lojistas não deixariam
experimentar, ainda que o boneco seja de isopor. Com óculos a coisa também não
funciona, pois são milhares de armações disponíveis. Além do mais, o rosto não
será detalhado no processo de escaneamento, por uma questão de privacidade. Vai
que algum credor da pessoa de carne e osso reconhece o seu modelo de
poliestireno e resolve atrapalhar a compra ou esquartejar o boneco? O mesmo
pode acontecer com um oficial de justiça ou até com alguém da polícia que
esteja no encalço de um eventual consumidor foragido... Então, decidimos que o
rosto da estátua terá aquela feição padrão de manequim de butique, para não
termos problemas.
Enquanto isso o contratante do
serviço fica no cinema, toma um chopp ou aproveita para comer um negócio - ele
só não pode comer ou beber muito, sob pena do boneco de isopor, ao final da
compra, não corresponder mais à silhueta do original.
Resumindo: ao mesmo tempo em que a
gente tem a chance de empurrar mais produtos no cliente, ele segue consumindo
na praça de alimentação e nos setores de entretenimento. Isso não é um
diferencial, é uma revolução mercadológica! No início, podemos causar
estranheza e até alguma rejeição, com os nossos funcionários andando pra baixo
e pra cima com os bonecos de isopor debaixo do braço. Porém, com o tempo, a conveniência
vai vencer a resistência. Podem ter certeza.
Bom, em linhas gerais, é esse o
projeto. Perguntas? Dúvidas?
© Direitos Reservados
Marcelo Pirajá Sguassábia é
redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e
eletrônicas.
Blog:
Email: msguassabia@yahoo.com.br
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