BETÃO IN CONCERT
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- Quero 32 toalhas brancas e bem felpudas no camarim. Uma
para cada sonata que compus. Pode me chamar de supersticioso, mas é isso. O
Mozart pede mulheres e caixas de absinto, antes e depois dos concertos, e
ninguém fala nada. Eu até que exijo muito pouco, só as toalhas e uma travessa
de arenque com batatas. Nenhuma excentricidade.
- E o bis? Já escolheu o que vai ser?
- Vai depender de como eu estiver na hora, não vou resolver
isso agora, de jeito nenhum.
- Mas Beethoven, a orquestra precisa saber para ensaiar.
Como é que...
- Eles que se virem. Todo mundo não me chama de louco? Deixa
eu fazer jus à fama. Pode ser a Pastoral, mas não dou certeza.
- Espera aí, uma sinfonia inteira como bis? O público vai
cansar, são cinco movimentos.
- Quem quer bis de dois minutos que vá assistir à Madonna.
Chega de bisar com a "Pour Elise" e fazer merchandising gratuito pra
Ultragas. Aliás, maldita a hora em que vendi os direitos dessa peça. Nem eu
aguento mais aquele caminhão.
- Tá, tudo bem. E quem abre o show?
- Liga pro celular do Schubert e vê se ele está disponível,
se bem que até anteontem ele estava em estúdio mixando uma trilha de novela.
Mas fala pra ele pegar leve, alguma coisinha pouco barulhenta. O concerto é
meu, não dele. Nada de roubar a cena e me entregar o público destroçado.
- E a coletiva de logo mais, posso confirmar?
- Contanto que os benditos repórteres falem bem perto do
microfone, pode. Tô de novo com aquele zumbido estranho no ouvido, preciso
marcar um horário no otorrino pra ver o que é isso.
- Bom, mudando de assunto, estou aqui com o layout que a
agência de promoções enviou, divulgando o concerto em Praga, no dia 12.
- Olha, que não me venham com aqueles trocadilhos infames
que andaram criando ultimamente... "Beetho ven aí" ninguém merece!!
Não sei onde estava com a cabeça quando aprovei aquela merda.
- É, mas veio gente pra caramba.
- Daqui pra frente quero espaços menores, shows mais
intimistas, tipo banquinho e violoncelo. No máximo um conjunto de câmara, uma
coisa mais unplugged, sabe como é?
- Mas não podemos mudar isso agora, no meio da turnê. Só na
orquestra temos mais de 150 músicos, todos com contrato assinado até setembro
do ano que vem.
- Antes que me esqueça, aqueles backing vocals na nona
estavam muito esganiçados. Pode pôr na rua todas as sopranos e me traga gente
nova, que não assassine meus hits. Respeito à partitura é bom e eu gosto. Tem
outra: a tietagem na fila do gargarejo fica puxando fumo demais. Até eu fico
maconhado por tabela e acabo errando a regência. Reforço de segurança neles. E,
pelo amor de Deus, não me deixa ninguém subir ao palco pra rasgar minha roupa.
- É o preço da fama, Betão.
- Não me chama assim, ou então vai pra rua também. E aí, meu
filho, o que vai te sobrar é um ou outro freela com o Haydn. Tá a fim?
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Marcelo Pirajá Sguassábia é
redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e
eletrônicas.
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Email: msguassabia@yahoo.com.br
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