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Numa
partida de xadrez, qualquer deslize pode ser fatal. E os possíveis deslizes, no
caso, estão diretamente relacionados à qualidade do feltro colado sob cada uma
das peças do jogo. É sobre essa questão de complexidade extrema que o autor
resenhado debruçou-se ao longo de dois anos, numa defesa de tese que chega
agora em forma de livro ao mercado editorial brasileiro.
Os
primeiros capítulos são dedicados ao enunciado teórico no qual o autor sustenta
o fato de que, a partir da rugosidade da superfície do tabuleiro, podemos
estabelecer a espessura ideal para o feltro das peças, a fim de que se evite o indesejado
deslizamento. A equação, exaustivamente exposta em todas as suas variáveis, põe
por terra os fundamentos até então cientificamente aceitos de que a relação
feltro/tabuleiro era meramente de ordem estético-funcional, não interferindo de
maneira determinante no resultado do jogo.
Ora,
sendo as pelejas enxadristas marcadas pela habilidade dos jogadores em manejar
raciocínio e estratégia, tornam-se inócuos estes esforços se os lances
meticulosamente estudados não encontrarem amparo suficiente para que se
mantenham firmes sobre o campo de ação onde interagem os agentes, ou seja, o
tabuleiro.
Outros
fatores interferentes, segundo o autor, podem ainda comprometer o já
naturalmente instável embate das forças que se rivalizam. Dentre elas,
destaca-se a influência do vento sobre o posicionamento correto das peças nas
partidas ao ar livre - especialmente os peões, quase sempre de menor peso em
função de suas dimensões reduzidas, e portanto mais vulneráveis. Há ainda
outras constatadas, mesmo que não preponderantes para efeito estatístico de
suas ocorrências: movimentações de terra causadas por terremotos, trepidação
pela passagem de comboios nas proximidades, esbarrões de cotovelos durante o
processo de abanamento de moscas e até mesmo espirros dos players, quando em
velocidade superior a 55
km/h .
Dentre
as diversas soluções levantadas de prevenção aos deslizes, algumas destacam-se
pela originalidade de abordagem. Como esta, exposta no capitulo 8: “Em toda e qualquer jogada, deve-se
preferencialmente remover a peça de sua posição original, saltar sobre as
demais e reposicioná-la sobre a nova casa, impedindo assim a fricção do feltro
sobre o tabuleiro, o desgaste prematuro de ambas as superfícies e suas
desastrosas consequências.”
Inúmeras
partidas, algumas delas valendo título mundial, já foram brutalmente
interrompidas pela repentino desmonte do jogo, após horas de certame. O autor
recorda, inclusive, o emblemático episódio envolvendo os russos Sharopov e
Strochnikov, quando este último, ao ajeitar-se em sua cadeira, deu com o joelho
direito na quina da mesa e não deixou pedra sobre pedra, invalidando a disputa.
Avesso
ao excesso de academicismos, o que seria justificável pela aridez teórica do
assunto, o autor consegue a proeza de conduzir o leigo em sua argumentação de
forma lúdica e prazerosa, fazendo com que as 573 páginas mais pareçam um
romance que um tratado científico.
© Direitos Reservados
Marcelo Pirajá Sguassábia é
redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e
eletrônicas.
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Email: msguassabia@yahoo.com.br
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