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sábado, 29 de novembro de 2014

DEMORANDO NO BOX

Imagem: leriaselixos.com.br


EU SONHO COM STRUDELS NESSES MESES DE ALUCINAÇÃO. DAQUELES TRANSBORDANTES DE RECHEIO, TÃO GENEROSOS DE MAÇÃS E PASSAS QUE MELEM TODA A CAIXA DE BRITA NO S DO SENNA. STRUDELS QUE PASSEM RASPANDO NOS GUARD RAILS DE MÔNACO, DEIXANDO UM RASTRO DE CANELA E AÇÚCAR DE CONFEITEIRO. UNS TRINTA BÓLIDOS-STRUDEL, LINDOS E RELUZENTES. RUMINAREI UM A UM, E DEPOIS DE EMPAPUÇADO USAREI A BANDEIRA QUADRICULADA COMO GUARDANAPO.

- Ele vai ficar bom.
- O pior é que vai
- Apesar do coma, né. O cara é forte como um touro.
- Mas está imóvel. Imóvel, logo ele.

TOLOS, EU ESTOU ÓTIMO. QUEM ESTÁ EM COMA NÃO TEM CONSCIÊNCIA QUE ESTÁ. SE PENSO QUE POSSO ESTAR É PORQUE NÃO ESTOU. FALEM, FALEM MUITO. E PENSEM MESMO QUE EU VEGETO, PARA FICAREM BEM À VONTADE.

- Veja, Orthild, o contrato é muito claro. Em caso de óbito, o patrocinador honra o valor assumido até o final. Temos que mostrar perícia na manobra. A família não está em condições psicológicas de se atentar a esse assunto, e isso conspira a nosso favor. Ou ajeitamos a nossa vida agora, ou nunca mais.
- As procurações que temos dão conta de tudo?
- Penso que são suficientes.

BASTARDOS... O HOMEM LÁ DE CIMA, O DONO DE TODAS AS ESCUDERIAS, HÁ DE TIRAR A VIDA DE VOCÊS COM UM LOTE DE STRUDELS AZEDOS E COM VALIDADE VENCIDA..

- O queixo dele é grande mesmo, olha só. Não sei como cabia dentro do capacete.
- Não fosse pelo carro mais rápido, ele ganharia as corridas porque o queixo iria chegar na frente.

COMO VOCÊS SÃO MALDOSOS, TÃO CHEIOS DE HUMOR DE HUMOR INCONVENIENTE EM HORA IMPRÓPRIA. O QUEIXO É GRANDE PELA MASTIGAÇÃO COMPULSIVA DE STRUDELS. EM TODOS OS TREINOS CLASSIFICATÓRIOS, FIZ A VOLTA MAIS RÁPIDA ENTRE UM STRUDEL E OUTRO. E EU AGORA TENDO QUE ME CONTENTAR COM ESSE SORO. CHUCRUTES ME MORDAM.

- Tem hora que ele parece estar se mexendo.

MUITA, MUITA NEVE NA PISTA. VOAVA MONTANHA ABAIXO, COMO SE AO FIM DA PROVA HOUVESSE, NO LUGAR DE PÓDIUNS, DE CHAMPANHES E COLETIVAS, UMA BELA FORNADA DE STRUDELS FUMEGANTES À MINHA ESPERA.

- São espasmos inconscientes, ele não escuta nada. Nós precisamos ser mais rápidos agora do que ele foi a carreira toda. O ocorrido repercute cada vez mais na imprensa, o quadro se agrava e daqui em diante a contagem é regressiva.


QUATRO VOLTAS PARA O FINAL, TALVEZ TRÊS. UM STRUDEL DE OITO QUILOS, EM AÇO ESCOVADO, ME ESPERA SE CONSEGUIR VENCER... ESTOU PAGANDO PELA MINHA IMPRUDÊNCIA. DEVIA TER USADO PNEUS DE NEVE.






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sábado, 22 de novembro de 2014

BIG BROTHER SONORO




- Um diário fonado.
- Como assim, um diário fonado?
- Você liga um desses gravadorzinhos digitais e vai gravando tudo o que se passa. Eu disse tudo. Mas não um diário como os outros, onde alguém narra o que acontece de mais importante. É a vida gravada mesmo, um “Show de Truman” em áudio. Quando a memória do gravador estiver cheia, descarrego no computador e começo a gravar de novo, indefinidamente. Dia após dia, ano após ano.
- Ah, sei. Você desperta e vai dizendo: “abri os olhos, são seis e trinta, coloquei os dois pés no chão, primeiro o direito, depois o esquerdo, calcei os chinelos”...
- Pára, eu tô falando sério. Não é descrever o que rola, é viver com o gravadorzinho ligado. Como um “Big Brother”, mas sem as imagens. Olha só, agora mesmo estou gravando nossa conversa, que vai ficar pra posteridade. Veja aqui o bichinho escondido no meu bolso.
- Que idéia maluca. Pra que isso?
- Hoje pode parecer absurdo, mas imagine o valor de um documento assim pras próximas gerações. A sociedade do futuro saberá como era a vida das pessoas no século 21. Eu digo a vida íntima, o cotidiano nu e cru, entende? Nossos bisnetos herdarão uma relíquia de incalculável valor histórico. Nunca ninguém fez isso antes. Imagine se você pudesse ter acesso ao registro da vida da sua bisavó, minuto a minuto. Não seria sensacional?
- Isso inclui cada instante vivido, sem intervalos?
- Claro. Se editar, perde a credibilidade.
- Sei, e quando a gente estiver na cama? Vai que alguém rouba a traquitana e devassa nossa intimidade, pensa bem... Outra coisa, e na hora de ir ao banheiro? Entram até, digamos assim, as manifestações orgânicas de caráter involuntário? O barulho da descarga? As escovações de dente?
- Tudo, ininterruptamente, até o último suspiro.
- Que mórbido.
- Gravaremos o primeiro choro do nosso filho, os gritos na montanha russa, os rojões nos jogos da Copa, pessoas reclamando da fila que não anda, o motorzinho no dentista, a fala dos pedintes nos semáforos... não vamos mais correr o risco de não lembrar das coisas. O inventário detalhado da existência estará sempre à mão. Basta um “rewind” pra reviver os melhores momentos.
- Bom, já que é pra registrar, por que não faz isso em vídeo?
- É que aí a gente vai querer ficar arrumadinho o tempo todo. Quando uma câmera é apontada pra você, acabou a espontaneidade. Fora que o áudio vai mexer mais com a imaginação de quem estiver ouvindo lá no futuro. É como as radionovelas, só que uma radionovela real, que dura décadas. Se Deus quiser, né.
- Ok, suponhamos que você viva mais 50 anos. Será meio século de áudio estocado. Se algum louco se meter a escutar isso, vai perder 50 anos da própria vida pra ouvir o que você gravou. É preciso muito amor à sua pessoa ou à pesquisa antropológica, não acha não?
- Mas também não é assim. As 8 horas diárias de sono não seriam gravadas, porque aí não acontece nada mesmo. Seriam 16,6 anos de gravação a menos.
- Ah bom, aí já dá pra encarar a empreitada. São só 33 anos na escuta! Ora, tenha paciência.
- Repare que interessante metalinguagem: estou gravando você falando da gravação que a gente está fazendo. Maluco, né?
- Então, mas o problema...
(Neste momento, aparentemente, houve pane no gravador. Não há registro da continuação da conversa).

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

DELMA NÃO SABIA




O que tem a dizer sobre as denúncias do esquema de propina na Petrobras, onde 3% de todos os contratos ficavam para o seu partido?

No que se refere a essa história da capa da Veja, eu devo dizer que... falar que o PSDB varre tudo pra debaixo do tapete. Falar do mensalão tucano, falar da falta de água em São Paulo, falar do desemprego no tempo do Fernando Henrique. Falar do escândalo das privatizações e da emenda da reeleição. Falar que no meu governo tudo mudou pra melhor, e que, com o projeto “Brasil Carinhoso”, milhares de famílias...

A senhora não respondeu à pergunta. Essas folhas aí que a senhora está lendo provavelmente eram a sua “colinha” para os debates... me parecem lembretes para orientá-la...

Ai, meu Deus, que cabeça a minha. Tem razão. Ai, ai, ai... Deixa eu pegar o papel certo aqui, só um momento... Então, no que se refere à resposta que você me pede, se eu disser que não sabia de nada dessa história, seria uma inverdade. Eu desconfiava, sim, mas não tinha provas ou não queria aceitar que estava cercada de Iscariotes os mais variados. É como uma mãe, que sabe que o filho está metido em tráfico de drogas mas no fundo acredita que ele só sai de casa pra ir à escola dominical, compreende?

E quanto a todas as outras acusações de corrupção e mau uso do dinheiro público, envolvendo ministros e assessores diretos?

Pois é, no que se refere a isso tudo a que você se refere, eu fiquei passada quando a coisa foi pipocando na mídia. Ensandecida, fui me aconselhar com o Suplicy, que em questão de honestidade está acima de qualquer suspeita. Cheguei no apartamento dele em hora imprópria. Estava muito ocupado, de robe de chambre e com o rosto besuntado de creme esfoliante, redigindo a nova versão do projeto Renda Mínima. Cheguei e já fui destilando minha ira. Senti que ele me escutava, mas não ouvia. Depois que contei meu dilema ético, ele virou pra mim, baixou um pouco os óculos e disse apenas, com aquele seu olhar de ET da terceira idade: “Delma, o nosso partido jamais faria uma coisa dessas. Ponho minha mão no fogo, ponho o meu projeto de lei no fogo, eu toco fogo no Supla se for preciso!”. Dito isso, ele passou mais uma boa demão de esfoliante nas orelhas e no nariz, e em seguida insistiu pra que eu lesse um whatsapp cheio de segundas intenções, que ele queria mandar para a Joan Baez, antigo e ilustre affair. Lembro que a mensagem falava qualquer coisa sobre renda mínima, de que ele queria ver a renda mínima dela, algo assim.




Ainda no que se refere a essa história, eu disse aos companheiros que, se as acusações tivessem fundamento, teríamos que procurar os culpados e cortar na carne. Nesse momento o Lulinha entrou aos berros no gabinete, não se sabe de onde, dizendo que podia cortar qualquer carne, menos a Friboi. Não entendi o que tinha a ver uma coisa com a outra, porque o rapazinho, que eu saiba, nunca lidou com esse negócio de pecuária e frigorífico. É quase uma criança, até outro dia mesmo só mexia com games.

Consta que seu comando de campanha enviou mensagens SMS aos beneficiários do Bolsa Família, afirmando que o benefício iria acabar caso o governo Delma não continuasse. É verdade?

No que se refere a isso, eu acho que quem tem celular pra receber SMS não precisa receber Bolsa Família. Ou seja, se o sujeito recebeu a mensagem, ele não era o público-alvo dela. Pensa bem, meu marqueteiro não iria ser burro a ponto de montar uma estratégia tão ilógica.

Qual a sua versão sobre o uso dos Correios para distribuição de propaganda política do PT?

No que se refere a essa questão epistolar, a grande verdade é que não tem nada demais nisso. Se o carteiro vai ter que ir na casa do cidadão entregar carta, já aproveita a viagem e entrega um papelzinho nosso. Que é que tem de mais? Veja bem, ninguém tá mandando o carteiro nas casas dos brasileiros e brasileiras só pra entregar a propaganda... Aí sim, seria safadeza.

Muitos analistas sustentam que o seu know-how no assalto aos cofres públicos vem dos tempos da ditadura, como assaltante de banco...

No que se refere a esse mau passo involuntário, eu era contra a ideia desde o começo. Mas fui coagida por um companheiro, vulgo Bola Sete, a participar. Acabei concordando quando me afiançaram que eu ficaria só na retaguarda e que o revólver era de espoleta.


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