CONSTRUÇÃO - O MEMORIAL DESCRITIVO

Chico Buarque cursou Arquitetura na FAU - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, entre os anos de 1963 e 1965.


Esse negócio de música eu faço a fórceps. Na marra mesmo, mais por insistência dos outros. Não gosto, nunca liguei. Talvez a canção que eu tenha sentido algum gosto em fazer seja "Pedro Pedreiro", por ter a ver com minha paixão, a arquitetura. 

Sérgio, meu pai. Miúcha, minha irmã. Mais parentes, amigos, artistas, colegas de faculdade insistindo: a sua vocação é a música. Olha que letra! Isso no Festival da Record não ia ter pra ninguém.

Vinícius, o diplomata, tão amigo do meu pai, não me dá sossego toda vez que vem em casa. Fica enaltecendo coisinhas tolas e esquecíveis, que faço e largo pelos cantos deste nosso velho sobrado, que um dia ainda vou alterar completamente o projeto. Bobagens de pé quebrado como "Gente Humilde", "Noite dos Mascarados", "Gota d'água", "Roda Viva", "A banda"... 

Que o Niemeyer me perdoe por cometer estas fraquezas. E me arranje um estágio em seu escritório, no Rio.


CONSTRUÇÃO
Autor da obra: Francisco Buarque de Hollanda


Infra estrutura
Segue descriminadas as características da infraestrutura e no orçamento o material a ser usado.
Sapatas
As sapatas isoladas de concreto armado nas dimensões de 80x80x20cm, conforme projeto específico.
Vigas baldrames
De concreto armado nas dimensões 15x30cm, conforme projeto específico.
Impermeabilização
A face superior das vigas executadas serão revestidas com manta asfáltica, para posterior assentamento da alvenaria.
Alvenaria
Seguem descriminadas as características da alvenaria e no orçamento o material a ser utilizado.
Paredes
As paredes serão executadas com tijolos de estruturais de 11,5x19x24cm assentados em ½ vez com argamassa mista cimento, cal , areia média com traço 1:2:8.
Supra estrutura
A execução da supra estrutura será com laje pré-moldada com capeamento de 0,04cm concreto FCK 20MPA.
Cobertura
De madeira cambará de boa qualidade. As telhas serão do tipo
portuguesa com devidos acabamentos.
Instalações Elétricas
Rede Elétrica
A serem executadas em conformidade com as normas específicas, obedecendo às indicações no respectivo projeto.
As luminárias serão do tipo lâmpadas incandescentes de 100w e 60w, recebendo acabamento com globos de plásticos.
Instalações Hidráulicas
A rede hidráulica será executada de acordo com o respectivo projeto.
Instalações Sanitárias
Para destino dos afluentes será instalada uma caixa de gordura, e esta ligada ao tanque séptico, um filtro anaeróbio e sumidouro, de acordo com as normas técnicas NBR 7229/93 e NBR 13969/97. Caso haja rede de esgoto, será dispensado o sumidouro.
Revestimento
O reboco
As paredes e a laje receberão reboco aplicado em uma camada única com argamassa de cimento, cal e areia fina no traço 1:2:5, interna e externamente.
Os azulejos
As paredes que comportam hidráulica da cozinha e da lavanderia (frente pia fogão e do tanque), receberão azulejo do tipo piso-parede Pei IV até a altura de 2,00m, de cor clara, definidos pela fiscalização da obra.
O rejunte deverá apresentar tonalidade mais escura que o azulejo.
Piso
A caixa interna da obra será aterrado com macadame devidamente compactado. Uma camada de 5,0cm de brita será colocada sobre o aterro.
O contrapiso cor clara Pei IV será executado com concreto simples com 5,0cm de espessura sobre a camada da brita. O piso cerâmico a ser assentado será de cor clara.
Esquadrias
Seguem descriminadas as características das esquadrias.
Portas
Todas as portas internas e externas serão de madeira laminadas com batentes maciços. As fechaduras serão metálicas do tipo externo, interno e ou de banheiro, conforme local a ser aplicado.
Janelas
Serão de madeira, do tipo correr duas folhas.
Vidros
Do tipo liso, 3mm de espessura.
Pintura
As paredes deverão ser lixadas para receberem duas demãos de selador acrílico, e em seguida duas demãos de tinta acrílica. Nas janelas serão aplicadas duas demãos de osmocolor ou verniz, na cor definida pela fiscalização da obra.




Esta é uma obra de ficção.
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TELEMADRINHA

- Alô, pois não.

- ...

- Não, moça, ele não tá. Saiu de casa em pleno isolamento social, acredita? E não é que fosse emergência, que precisasse sair de qualquer jeito, longe disso! Parece até que fica arrumando desculpa pra dar uma escapada. E saiu sem máscara, ainda por cima.

- ...

- Eu ainda falei pra ele: escuta, mas e se a moça da Claro ligar, o que é que eu digo pra ela? Sempre que liga, ela insiste em falar contigo e eu não gosto de ficar arrumando desculpa, não. Ainda mais pra você, moça, que parece tão educada.

- ...

- E quando você telefona, é sempre pra ajudar, né? Eu diria que é até uma ingratidão da parte dele. Olha, vamos fazer uma coisa - me diz o número do seu telefone que, assim que ele chegar eu peço pra retornar a ligação. De mais a mais, faz tanto tempo que você liga pra gente, não tem cabimento você saber o nosso número e nós não sabermos até agora o seu... 

- ...

- Sabe, com essa história de todo mundo ficar trancado em casa o dia todo, às vezes bate vontade de trocar uma ideia com alguém e eu poderia, se não for incomodar, te ligar de vez em quando pra jogar conversa fora, sei lá...

- ...

- Tem uma outra coisa que eu nunca falei, porque não gosto de ficar me metendo na vida dos outros, mas sabe como é, né? Ele solteirão, você ligando três, quatro vezes por semana atrás do bonito, bem que podia dar certo um "algo mais" não é não? Tudo bem que a gente aqui em casa não te conhece pessoalmente, mas a minha intuição é que isso dava casamento, viu? Agora, conselho de amiga: se ele vê que você fica ligando toda hora, não dá valor, fica se sentindo por cima. Dá um gelo nele, minha filha. Faz ele ficar com a pulga atrás da orelha, se perguntando porque você sumiu. Assim, do jeito que tá, ele fica mal acostumado.

- ...

Venhamos e convenhamos, pra ele, que tá desempregado, juntar as escovas de dente com uma funcionária da Claro, seria tudo de bom. Empresa grande, né? O que você ganha aí acho que dá e sobra pra despesa de vocês dois. Olha, que tal vocês combinarem uma videoconferência? Um podia olhar para o outro, né? Aí quem sabe essa telepaquera acaba no altar, né não? Faço questão de ser madrinha.



Esta é uma obra de ficção.
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ALARME FALSO E TIRO NO PÉ

ALARME FALSO

A ideia é tão boa, mas tão boa, que tem tudo para dar errado. E certamente vai dar.

Basta um espaço de 2mx2m em qualquer fundo de quintal, o suficiente para acomodar algumas telas de silkscreen, tintas, placas de PVC ou de aço escovado. E só.

Arranjado este QG e este estoque inicial, baratíssimo, chega-se, dando busca no Google, às empresas de segurança residencial líderes em qualquer cidade. 

Ainda pelo Google, a partir deste primeiro passo, é fácil conseguir um zoom detalhado das plaquinhas afixadas nas residências protegidas em casas de classe média. Feito isso, parte-se para as réplicas das placas.

Daí segue-se à comercialização, esta sim porta a porta, diretamente com o dono de cada imóvel não-contratante da empresa de alarme top do município. 

Calculando, por baixo, o aparato de um sistema de monitoramento residencial de última geração, chegamos fácil a 5 mil reais. Fora a mensalidade da central 24 horas, a ser acionada em caso de qualquer problema. Quinhentos reais pela plaquinha em silk idêntica à fornecida pela empresa de segurança é uma oferta irrecusável para quem quer se proteger sem gastar muito. Claro que o morador continuará desprotegido, mas quem seria o louco do ladrão a arriscar uma investida em sua casa?






TIRO NO PÉ

A ideia é tão boa, mas tão boa, que tem tudo para dar errado. E certamente vai dar. 

Basta um espaço de 2mx2m em qualquer fundo de quintal, o suficiente para acomodar algumas placas de isopor, tinta cor grafite, um pirógrafo de segunda mão, faca afiada e mais nada.

Arranjado este QG e um estoque inicial, baratíssimo, parte-se para a confecção em isopor de réplicas de fuzis AR15. Daí para chegar ao mundo do crime e oferecer a mercadoria é a coisa mais fácil.

Calculando, por baixo, o valor de um fuzil desse calibre, chegamos fácil a 10 mil reais - se adquirido legalmente, o que quase nunca é o caso. Claro que o assaltante continuará desarmado, mas quem seria o dono de residência a encarar o ladrão com um fuzil daqueles?

A questão é saber se o meliante terá peito de ir em frente com sua arma de araque ao ver a plaquinha de (falso) alarme no muro da casa...



Esta é uma obra de ficção.
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